12.12.2006
O GRITO
Já que hoje é o aniversário do Munch, bastante conhecido pelo seu famoso Grito, decidi falar de um outro tipo de grito: o da reclamação e do incorformismo.
Sou desde pequena o que se pode chamar de uma bela refilona. Se acho que tenho razão, reclamo e não me calo. E não calo mesmo. Vejam só como não estou a mentir:
Bonitinha, não?! :)
Começou desde logo com os meus pais, o que me custou algumas bofetadas (muito bem dadas, diga-se. Hoje sou uma menina muito bem educadinha). Depois seguiram-se reclamações com os colegas, o homem do autocarro, os professores e nunca mais parei.
Lembro-me perfeitamente de ser expulsa da aula de Matemática, por me ter levantado e, em nome de todos, desatar a barafustar com a professora por nos chamar parvos.
“Não é com isultos que se educam as pessoas!!!”.
Indignadíssima, a professora cuspiu um “reduza-se ‘a sua insignificância” e mandou-me sair da sala. Muito embora nunca antes tivesse sido advertida dessa forma por um professor e não obstante ter sido sempre uma aluna exemplar, em desempenho e conduta, como me gostaria de me manter, nada mais me poderia ter dado tanto prazer do que sair daquela sala.
Sai de cabeça erguida e satisfeita por não ter engolido o insulto como todos os outros fizeram. Desde aí, nunca mais a Dona Pigmeu, como lhe chamávamos, nos insultou.
Acho que é por causa das faltas de reclamação que a sociedade não avança. O pessoal, basicamente, come e cala, acomodando-se ‘as coisas, pois é mais fácil não fazer nada do que reclamar. E assim se vai indo, contando já com a passividade do consumidor, e assim se continuam a assistir a injustiças.
O expoente máximo desta minha teoria teve lugar em Espanha, em Salamanca salvo erro, onde, juntamente com pais e irmã, acampámos por uns dias. Digo que foi o expoente porque serviu para converter alguém, mais propriamente a minha Madalê querida (vulgo Mãe), que também é muito teimosita mas teve que dar a mão ‘a palmatória.
Naqueles 15 dias de férias, o então meu namorado ficou em Portugal, enquanto andei a passear por terras Espanholas. Claro está que, ‘a noite, lá fazia eu o telefonema da praxe, para matar a saudade. Naquela noite, reuni as minhas moeditas (500 pesetas, na altura) e fui até ‘a cabine telefónica.
Pus o dinheiro, como de costume e, sem sequer ter tido tempo de pertanejar, a maquineta ficou-me com as moedas sem ter efectuado a ligação. Após as típicas tentativas de bater várias vezes no telefone, pôr e tirar o auscultador, verificar se algumas moedas teriam caído, segui frustrada para a roullote, sem efectuar a chamada e deixando o namorado indefinidamente ‘a espera.
No dia seguinte, bem cedinho, enquanto estávamos a tomar o pequeno-almoço, disse:
- vou indo para a recepção e espero lá por vocês. Vou reclamar do dinheiro que perdi!
A minha mãe riu-se:
- Dá-te para boa! E é logo aqui em Espanha que vais reclamar. Amanhã já vamos embora, não te serve de nada.
- Azarito!! Ao menos reclamo. Se não fizer nada é que tenho a certeza que não reavejo o dinheiro.
Abanou a cabeça como quem diz “é sempre a mesma… teimosa!!” e, ainda sorrindo, só disse:
- vai lá… se ficas feliz!
E lá segui eu, sentindo nas costas o sorriso de “é sempre a mesma… teimosa!!” da minha mãe.
Chegada ‘a recepção, expus o meu caso, ao que a mulherzita me disse que as cabines são da responsabilidade da Telefónica, pelo que a única coisa que ela podia fazer era dar-me um formulário de reclamação para eu preencher e ser enviado ‘a companhia. Assim fiz.
Quando os meus pais me apanharam e seguimos para a visita turística do dia, contei o sucedido… e a minha mãe ainda se riu mais:
- Sim! Sim! Bem podes esperar. Não me digas que estás ‘a espera que te mandem o dinheiro para Portugal?!?!
Não só mandaram, como o fizeram ainda antes que nós lá conseguíssemos chegar. Quando regressamos, tinha na caixa do correio uma carta da Telefónica a dar-me toda a razão, a pedir-me desculpa pelo sucedido e pelo inconveniente e ainda… um cartão telefónico no valor de 1000 pesetas (o dobro do que eu tinha perdido).
Após este episódio, é ver a minha mãe reclamar até hoje, sempre que acha que o deve fazer e dizer: vale sempre a pena, como a minha Nês fez em Espanha!
Esta historieta toda vem a propósito de uma situação recente.
Aqui, para se estacionar o carro, é uma dor de cabeça. Tem que ser ter uma permissão de parqueamento para aquela zona em particular, caso contrário, pimba: em menos de nada temos uma multa escarrapachada no vidro do carro. E se os gajos são rápido… não dão folga nenhuma. Assim, se eu moro em Somerville, não posso estacionar em Cambridge e “viso-versa”. como dizia alguém que conhecia.
Ora, acontece que na rua onde moramos não há esse requisito (deve ser milagre) e, por isso, estacionámos o nosso popó tranquilamente, mesmo sem termos ainda o autocolantezinho que diz que ali moramos e que podemos estacionar em Somerville. Na manhã seguinte, o que é que temos ‘a nossa espera? Nem mais, uma bela multa!
O David conformou-se logo, dada a rispidez do sistema.
Eu olhei para aquilo e só consegui rir. Primeiro, veio um bófia de Cambridge multar-nos em Somerville (só pensei: mas o gajo não tem mais nada que fazer ‘as 9 da matina de Domingo?) e depois o motivo da multa era “falta de autocolante de parqueamento”.
- Só podem estar a gozar!! Não pagamos!!! (e de repente pareceu-me ouvir as manifestações dos estudantes quando eu andava na FCUL, contra as proprinas! Mas foi mais ou menos esse o espírito).
Zás-trás-pás, ligo para a Câmara Municipal de Somerville, confirmo que de facto não era preciso autocolante, meto a reclamação a caminho pela internet e há dias recebi a cartinha em casa a dizer que sim senhor, tínhamos razão, e que a multa estava sem efeito.
E “mai” nada!!
Não me calo e não me calo!
Até parece que ouvi a minha Madalê:
- vale sempre a pena, como a minha Nês fez em Espanha! :)
Subscribe to:
Posts (Atom)