1.17.2006

Hawaii, here I come! *

Agora ‘a distância, vejo que a perda das luvas em Nova Iorque era já sinal de mau agoiro.

De 6a feira para Domingo a temperatura desceu vertiginosamente. Assim, muito embora tivesse um casaco algo grosso, não estava minimamente preparada para os -21 ºC que me esperavam quando regressei a Boston, Domingo ‘a noite (note-se que na 6ª feira saí de cá com 10ºC positivos).

Passei ainda pelo laboratório e, por volta das 22h, decidi-me a ir para casa. Uma vez que estava de bicicleta e sem luvas, só pensava em pedalar rapidamente, tanto para aquecer como para chegar logo logo ao quentinho do lar. Escusado será dizer que, mesmo assim, quando lá cheguei, quase não sentia as mãos e estava gelada. Procurei avidamente as chaves no bolso das calças, a custo (porque os dedos já pareciam trambolhos), consegui pegar na chave desejada e, quando vou a metê-la na ranhura... não entra.

- Quê?! Mas é esta a chave!!

Olhei bem de novo e lá estava o plástico azul que a identifica. E entretanto, o vento soprava desalmadamente e o frio era cada vez mais frio. Nova tentativa, e chave nada de entrar. Se com as mãos normais já dói forçar uma chave na fechadura, com os dedos completamente congelados ainda é pior. Entretanto, já não sentia o queixo nem os lábios e os pés iam pelo mesmo caminho.

- Queres ver que ainda me vai dar o badagaio como em Veneza!? (onde devido a hipotermia só me lembro de apagar na praça de S.Marcos e acordar algures num Banco com um amigo a esfregar-me os pés, que não sentia, e um namorado a tirar as meias e o casaco para me dar roupas secas). Só que desta vez vai ser ridículo. Quando me virem vão julgar que sou parvinha por ter na mão a chave que abria a porta ‘a minha frente e ter ficado cá fora.

Já desesperava. A quase meia hora que fiquei ao frio a tentar inutilmente introduzir a chave na fechadura pareceu-me interminável. Basicamente a fechadura congelou (e sei que isto acontece porque, na Alemanha, também fiquei uma hora ao frio ‘a espera de um amigo que, porque as portas do carro congelaram, não se conseguia deslocar e, quando chegou, tive que entrar pela porta dele, porque só tinha conseguido abrir uma das portas). Estava tão desesperada com o frio que quase pensei em pedir ‘a pessoa que estava dentro de um carro do outro lado da rua para me deixar entrar e aquecer um bocadinho. Como os vidros eram escuros e não conseguia vislumbrar quem estava lá dentro, pensei que seria melhor dar-me o fanico a arriscar... mas pelo andar da carruagem iria mesmo arriscar.

Entretanto já pensava em alternativas: telefonar para a senhoria, que mora na casa ao lado. Olhei para lá e estava tudo apagado.

- F***sse (desculpem lá, mas nesta altura já não ligava puto ‘a boa educação. Eram raios e coriscos para todo o lado) é fim de semana prolongado (feriado Martin Luther King na 2ª feira), não deve estar.

Após um esforço estóico para pressionar as teclas correctas no telemóvel (a esta hora as mãos já estavam roxas) confirmei o que temia.

- Não atende... bonito!

Próxima vítima, o meu melhor amigo (vide fotos publicadas há dias):

- “Mori”! Pre-pre-ciso da tu-tua ajuda (isto é para que o leitor perceba que com o frio já nem conseguia falar direito). Não consigo entrar em casa!!! A porta está congelada! Será que me podes vir cá ajudar ou então eu posso ficar na tua casa? (isto tudo dito na mesma linguagem, topam? Parecia o Emplastro a falar).

Obvio que, de imediato, Z. começou a preparar os arreios do cavalo para se fazer ao caminho e vir salvar a donzela mas, não foi preciso. Eis que uma alma caridosa se lembrou de me ajudar e, afinal, a senhoria estava em casa (só que como é gorducha não se deve ter conseguido deslocar a tempo para atender o telelé) e ligou-me nesse instante. Faço mais um esforço hercúleo para marcar a tecla certa do telemóvel e aviso o meu cavaleiro:

- Aguenta os cavais, “mori”. Acho que a gorducha me vai salvar! (bem sei que não é assim nas histórias mas, não queria que também ele congelasse, coitadinho!).

A senhoria abre-me então a porta das traseiras e, finalmente, consigo entrar em casa, pela cozinha. Nesta altura os meus dedos já estavam tão mas tão congelados que basicamente não os sentia. O pior foi quando começaram a reanimar. As dores eram tão intensas e o latejar/queimar tão forte que durante 15 minutos as lágrimas me escorriam pela cara abaixo involuntariamente.

Quando finalmente tudo voltou ao normal, verifiquei que fiquei com as pontas dos dedos da mão direita queimados... e fónix, hoje ainda me doem.

Assim, depois de tamanha aventura (ou antes, desventura), tomei um resolução irrevogável. Quando terminar o Ph.D, o meu destino vai ser um local quente, cheio de sol e com pessoas sempre morenas (obviamente que com isto não quero dizer que vá trabalahr num solário :P)

E mai nada!

* Mais coisa menos coisa!

7 comments:

Anonymous said...

Coitadinha da minha filhota. Só de ler, até senti o frio a regelar-me as mãos.
Outras luvas de reserva, torna-se completamente obrigatório na bagagem.

Anonymous said...

A tua recordação de Veneza trouxe-me boas memórias...que saudades desse tempos...
Um abraço muito quentinho desta amiga cheia de saudades...

Fadalê said...

O percalço de Portimão ( lembras-te?? )causou-nos angústia e sentimento de impotência. Nada podíamos fazer... mas... em comparação, foi como ( sói dizer-se ) limpar o cú a meninos, tal a ligeireza comparativa.
Como te compreendo !!!!

∫nês said...

Marie Juon: Saudades mesmo. Nem sabes quantas vezes me lembro dessas nossas viagens. Obrigada pelo abraço quentinho. E' muito útil e desta vez é a tua vez de me ajudares :)
(e lembras-te quando nos pusemos com as botas de 40 contos da Mafalda a girar com elas na janela do WC, também em Itália? LOLOLOLOL. Dá-me sempre uma vontade enorme de rir quando me lembro!)

Phatinitos: Já passou. E, vistas 'a distância, estas coisas acabam sempre por nos fazer sorrir :)

Maffa said...

Bem, depois do teu episódio gelado fui-me informar e parece que pelas bandas da Dinamarca tb congelam fechaduras. Ai ai... já tou a tremer... Nao sei que acessório deverei juntar à minha bagagem... talvez um saco de água quente?

∫nês said...

Eu aconselho um isqueiro para charutos, que parecem um maçarico em miniatura ou, como gosto de lhe chamar, um maçariquito :)

Anonymous said...

coitadinho da minha bambinita!!!
ficou congeladita.
" ai maninha não te apagues!!!" (em tom de fado)
Realmente há diad em que mais vale não sair da cama, neste caso de casa/ laboratorio.
jokas muito grandes.
meb